"Império" e a relação com outros trabalhos de Aguinaldo Silva

Aguinaldo Silva, em trabalhos anteriores, já usou e abusou de referências a outros folhetins de sua carreira. Questionado, certa vez, em entrevista ao programa "Roda Viva" da TV Cultura, sobre ter deixado de fazer novelas regionalistas, ambientadas em cidades fictícias do interior do nordeste, Silva respondeu que nunca deixou de fazê-las e que, mesmo transferindo-as para a rotina do Rio de Janeiro, suas tramas funcionam como "pequenas comunidades" que reúnem os tipos característicos que marcam seus trabalhos. 
Com a estreia de "Império", tramas e personagens da carreira televisiva de Silva voltaram às telas e trouxeram à tona algumas repetições de obras do autor...

1) O Imperador

No Rio de Janeiro de 2014, o Comendador José Alfredo Medeiros (Alexandre Nero) é conhecido como o Imperador das Joias, depois de ter começado do zero e feito fortuna com o garimpo. Mas, no mesmo cenário carioca, só que no ano de 1999, quem reinava era Waldomiro Cerqueira (José Wilker), o Imperador do Mármore da novela "Suave Veneno". Assim como o protagonista de "Império", Cerqueira era pobre e fez fortuna explorando jazidas de minério. As "coincidências" não param por aí, já que ambos possuem três filhos e um outro bastardo. Apesar de casado com Maria Marta (Lilia Cabral), José Alfredo vive separado da mulher, apenas em um casamento de fachada. Cerqueira também tinha uma ex-mulher em seu caminho, já que Eleonor (Irene Ravache) se considerava esposa do Imperador do Mármore mesmo depois da separação.

2) Da mesma família

Além de serem vilãs, Maria Marta e Maria Altiva (Eva Wilma), da novela "A Indomada", possuem outra semelhança: elas fazem parte da mesma família. Ambas são representantes da linhagem dos Mendonça e Albuquerque, o que remete a uma certa tradição de aristocratas. Mas, só remete... Falida, Maria Marta só é rica porque se casou com José Alfredo. Em mesma situação estava Altiva, que só "mandava e desmandava" em Greenville por conta da fortuna do marido Pedro Afonso (Cláudio Marzo), este sim de família tradicional no nordeste e dono de uma usina de cana de açúcar. Se tirarem o dinheiro dessas duas Mendonça e Albuquerque, só lhes restará a pose.

3) Em nome da fé

A religiosidade e a fé em Deus são as desculpas que unem duas vilãs de Aguinaldo Silva. Em "Império", Cora (Drica Moraes) toma atitudes egoístas e condenáveis, sempre amparada por argumentos que envolvem a moral e a fé cristã. Por vezes, condenou as escolhas da irmã Eliane (Malu Galli), que traiu o marido e teve um romance com José Alfredo. Quem também não concordava com a postura da irmã era o beata Perpétua (Joana Fomm), que afirmava para toda a população de Santana do Agreste que Tieta (Betty Faria) era "quenga". Ambas parecem ter em comum, também, uma cerca repressão, que as impede de levar a vida do jeito que gostariam.

4) A ambição dos filhos mais velhos

Todo império é alvo de muita ambição nas novelas, mas Aguinaldo Silva definiu que os principais ambiciosos de duas de suas tramas fossem os filhos mais velhos dos protagonistas. No atual folhetim das nove, José Alfredo tem em José Pedro (Caio Blat) o seu principal opositor, aquele que sonha em gerir os negócios da família e usufruir de toda a fortuna. O imperador Waldomiro Cerqueira também passava pelo mesmo problema em "Suave Veneno", tendo que lidar com o gênio forte e a ambição da primogênita Maria Regina (Letícia Spiller). Assim como José Pedro quer comandar a Império das Joias, a vilã só pensava em derrubar o pai e cuidar da Marmoreal. 

5) A filha fora do casamento

Nenhum exame de DNA foi feito até agora para definir se Cristina (Leandra Leal) é mesmo filha bastarda do Comendador José Alfredo, ou se é apenas a sobrinha dele. Mesmo assim, a mocinha de "Império" já é considerada como tal, inclusive pela tia Cora, que quer aproveitar o parentesco para usufruir da fortuna do empresário. Lá em 1999, o Imperador do Mármore de "Suave Veneno" também deu de cara com Clarice (Patrícia França), uma filha que teve fora do casamento. A diferença entre as duas é que Clarice armou um plano de vingança contra o pai e acabou assassinada durante a trama, o que parece estar longe de acontecer com Cristina na atual novela de Aguinaldo Silva.


6) A megera e o mordomo

Para sustentar tanta soberba, Maria Marta conta com os serviços do mordomo Silviano (Othon Bastos), um funcionário que, além de suas atribuições, também serve de confidente e cúmplice para as maldades da patroa. Em seu trabalho anterior na televisão, Aguinaldo Silva escreveu uma megera que também contava com os serviços de um fiel escudeiro. A dondoca Tereza Cristina (Christiane Torloni) era a "Rainha do Nilo" de seu "castelo" na Barra da Tijuca, em "Fina Estampa". A madame que valorizava mais a aparência do que o caráter das pessoas tinha na figura de Crô (Marcelo Serrado) um aliado para todas as tarefas, sejam elas domésticas ou não. 

7) Roteiro gastronômico

Aguinaldo Silva parece estar querendo transformar suas novelas em um roteiro gastronômico do Rio de Janeiro. Atualmente, em "Império", o restaurante do chef Enrico (Joaquim Lopes) é o mais badalado entre os personagens do folhetim. Em 2011, na novela "Fina Estampa", o restaurante mais famoso era o Le Velmont, comandado pelo chef Renê (Dalton Vigh). Já em "Senhora do Destino", o Monsieur Vatel era parada obrigatória para os personagens que apreciavam a boa cozinha, sempre comandada por Edgar (Dan Stulbach). Parece mesmo que o autor é fã do mundo das panelas.

8) Do you speak english?

A influência das culturas inglesa e norte-americana também esteve presente nas tramas de Aguinaldo Silva. Em "Império", depois de enriquecer, José Alfredo parece ter se encantado com a língua inglesa e sempre dá um jeito de incluir palavras dessa cultura em suas frases. Já em "A Indomada", Altiva era a principal incentivadora do inglês em Greenville, cidade do litoral do Nordeste que havia sido colonizada por ingleses. Na trama, era comum ouvirmos expressões como "oxente, my God", "very well", "unbelievable", entre tantas outras. Anos depois, em "Fina Estampa", Eva Wilma interpretou a golpista Íris e voltou a repetir frases em inglês.

9) A mãe arrependida

Na novela "Fina Estampa", Aguinaldo Silva escreveu a história da mãe que abandonou marido e filho em busca de uma vida melhor. Anos depois, Teodora (Carolina Dieckmann) volta para tentar recuperar a convivência com o filho. Em seu atual trabalho, o autor parece ter vontade de retomar a trama com Tuane (Nanda Costa), personagem que abandonou o filho e o relacionamento com Elivaldo (Rafael Losso) para se casar com Reginaldo (Flávio Galvão). Agora, ela quer, a todo custo, tirar a guarda do menino do pai e levá-lo para viver com ela. 

10) A escola de samba

As quadras de escolas de samba também parecem estar entre os cenários preferidos de Aguinaldo Silva. Em "Império", o autor não foge à regra e criou a Unidos de Santa Tereza, chefiada por Antoninho (Roberto Bonfim). Já na novela "Senhora do Destino", o felomenal Giovanni Improtta (José Wilker) comandava a Unidos de Vila São Miguel, agremiação da Baixada Fluminense. Vale lembrar que na trama de "Duas Caras", em 2007, Silva também criou uma escola de samba, que ficava sediada na favela da Portelinha e tinha como presidente o líder comunitário Juvenal Antena (Antonio Fagundes).


11) A rainha de bateria

Toda escola de samba que se preze precisa de uma rainha de bateria, sendo esta outra das figuras presentes em obras de Aguinaldo Silva. Na novela "Império", mesmo que aposentada, Juliane (Cris Vianna) é a representante da categoria, dando claros sinais de que voltará a ocupar o posto à frente dos ritmistas da Unidos de Santa Tereza. Já em "Senhora do Destino", Nalva (Tânia Khalil) era a rainha que representava a escola Unidos de Vila São Miguel na passarela do samba.


12) O gay engraçado

A privacidade dos personagens de "Império" é ameaçada pelo blogueiro Téo Pereira (Paulo Betti), um jornalista "marrom" que vive de especular sobre a vida alheia. O esteriótipo do gay engraçado da trama, atualmente, se dedica a tirar o cerimonialista Cláudio Bolgari (José Mayer) do "armário". Em "Fina Estampa", o mordomo Crô exercia função similar a de Téo, responsável pelos momentos cômicos e pelas frases de humor da trama. Até mesmo alguns trejeitos parecidos aproximam os dois personagens.

13) A chantagista

Testemunha de um crime que envolve o filho mais velho de Maria Marta, Lorraine (Dani Barros) decidiu chantagear a vilã em troca de silêncio. As ameaças e a extorsão fizeram com que Maria Marta mandasse matar a testemunha, plano este que deu errado. "Fina Estampa" também teve uma chantagista: a jornalista Marcela (Suzana Pires), que constantemente ameaçava revelar os segredos da vilã Tereza Cristina. Depois de muitos conflitos, Marcela acabou assassinada pela socialite da Barra da Tijuca. Resta saber se, agora, Lorraine terá o mesmo destino que sua antecessora.

14) Vida de migrante

José Alfredo venceu no Rio de Janeiro, depois de vir do Nordeste do país. Mas, ele não é o único. Da mesma forma, Maria do Carmo (Suzana Vieira), a protagonista de "Senhora do Destino", fez fortuna em solo carioca depois de migrar de Pernambuco. Quem também tinha origem nordestina era o Imperador do Mármore de "Suave Veneno". Waldomiro Cerqueira também consolidou sua fortuna no Rio, depois de deixar Pernambuco.

15) O fiel capanga

Além de contar com um mordomo, o staff das vilãs de Aguinaldo Silva também precisa contar com um fiel capanga. Em "Império", Maria Marta anda recebendo a ajuda do motorista Brigel (Leanddro Rocha) para executar alguns serviços mais ilícitos. Na Barra da Tijuca de "Fina Estampa", a madame Tereza Cristina requisitava Ferdinand (Carlos Machado), segurança do condomínio em que morava, para executar os planos contra a família da protagonista Griselda (Lilia Cabral).

16) A mesma trilha sonora

Depois de tantas semelhanças com outras obras de Aguinaldo Silva, faltava falar de música. Em "Império", Robertão (Rômulo Neto) é um "boa vida", que só quer saber de se dar bem. As cenas do personagens são marcadas pela canção "Vamos Dançar", de Ed Motta, mesma trilha sonora de Juan (Carlos Casagrande), o empresário de "Fina Estampa" que não abria mão de uma vida confortável, mesmo tendo que cuidar dos negócios.

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